Avaliação da combinação de decitabina/cedazuridina e venetoclax para pacientes virgens de tratamento com síndromes mielodisplásicas de alto-risco ou leucemia mielomonocítica
O estudo open-label de instituição única teve como foco a associação das drogas venetoclax – um inibidor de BCL-2 – e decitabina/cedaruzidina, cuja formulação oral foi recentemente aprovada para o tratamento de síndromes mielodisplásicas pela Food and Drug Administration dos Estados Unidos
Escrito por: Flávio Pignataro Oshiro
Revisado por: Dálete Barcelos
No geral, pacientes com Síndromes Mielodisplásicas de Alto-Risco (HR-MDS) apresentam baixa sobrevida global. O tratamento padrão para esses indivíduos consiste no uso de agentes hipometilantes (HMA), que requerem administração prolongada e penosa por via parenteral. Além disso, não apenas o transplante de células-tronco alogênico permanece a única terapia curativa, como só é aplicável a um grupo seleto de pacientes. Visto que a adição do venetoclax aos agentes hipometilantes resultou em taxas de resposta aumentadas e melhoria na sobrevida global de pacientes com leucemia mieloide aguda, essa estratégia emergente mostrou-se valiosa para o tratamento de pacientes com HR-MDS.
Neste trabalho foram recrutados pacientes virgens de tratamento, com diagnóstico prévio de MDS ou leucemia mielomonocítica crônica, ou aqueles que apresentavam blastos em proporção maior que 5% na medula óssea. A primeira fase do estudo consistiu no escalonamento de dose, enquanto a fase II investigou a expansão de dose e a avaliação da eficácia da combinação.
No total, 37 pacientes foram recrutados entre janeiro de 2021 e janeiro de 2023, sendo 26 (70%) do sexo masculino e com média de idade igual a 71 anos. A maior parte deles (65%) apresentou MDS com excesso de blastos em grau 2, segundo a classificação da Organização Mundial da Saúde. O grau de risco citogenético de acordo com o IPSS foi bom em onze pacientes (30%), intermediário em 12 (32%) e ruim em 14 (38%). Além disso, a mediana de mutações por pacientes foi igual a três, variando de uma a quatorze, sendo que as mais comuns ocorreram nos genes ASXL1 (49%), RUNX1 (38%), SRSF2 (30%), TET2 (22%) e TP53 (19%);
Nove pacientes participaram da primeira fase do estudo, recebendo doses que variaram de 200 a 400mg de venetoclax, e uma dose de 100/35mg de decitabina/cedazuridina ao longo de duas semanas. Como não foram reportados eventos de toxicidade, a dose estabelecida foi de 100/35mg de decitabina/cedazuridina nos cinco primeiros dias, e 400mg de venetoclax ao longo de duas semanas. O número mediano de ciclos aplicados foi de dois, variando entre um e treze, sendo um o número de ciclos necessários para atingir tanto a resposta primária quanto a melhor resposta, variando entre um a seis.
Os principais resultados do trabalho incluem:
- Taxa de resposta global: 94,5%, sendo treze respostas completas (35,1%), 11 remissões de medula com melhora hematológica (29,7%), e 11 remissões de medula (29,7%);
- Duração mediana da resposta: 23 meses;
- Após acompanhamento mediano de 9,6 meses, a sobrevida mediana global não foi alcançada, e a sobrevida livre de progressão mediana foi de 23 meses;
- Entre pacientes com anormalidades citogenéticas no diagnóstico, 53% obtiveram resposta citogenética;
Foram observados eventos adversos de graus três e quatro relacionados ao tratamento em 34 (92%) e 31 (84%) dos pacientes, respectivamente. Os eventos mais comuns desses graus foram a redução na contagem de plaquetas (81% dos casos), redução da contagem de neutrófilos (70% dos casos), neutropenia febril (19% dos casos), e anemia (16% dos casos). Já as complicações infecciosas de graus três ou quatro incluíram infecções pulmonares (11% dos casos), de pele (8% dos casos), sepse (5% dos casos) e infecção por SARS-CoV-2 (5% dos casos).
O tratamento foi descontinuado em razão de transplante de células-tronco alogênico (49% dos casos), decisão do paciente ou da equipe clínica (11% dos casos), progressão da AML (5% dos casos), ou falta de resposta (3% dos casos). Além disso, ocorreram três mortes ao longo do estudo, sendo duas por sepse e uma por pneumonia, resultando numa taxa de morte de 0% em quatro semanas e 3% em oito semanas.
Portanto, a combinação de decitabina/cedazuridina com venetoclax é uma terapia com drogas orais promissora, que apresentou boa tolerância e uma alta taxa de resposta entre pacientes com síndromes mielodisplásicas de alto risco.
Referência: Bataller et. al, 2023. PHASE 1/2 STUDY OF ORAL DECITABINE/CEDAZURIDINE IN COMBINATION WITH VENETOCLAX IN TREATMENT-NAÏVE HIGHER-RISK MYELODYSPLASTIC SYNDROMES OR CHRONIC MYELOMONOCYTIC LEUKEMIA. Apresentado no congresso da European Association of Hematology, em 2023. Informações do Ensaio Clínico: NCT04655755.